(ou, Nove Teses sobre a Insurgência)
Publicado originalmente em primeiro de Outubro de 2014 pelo Institute For The Study of Insurgent Warfare.
Tese 1: Até o momento, críticas ao ativismo tendem a se concentrar nas características do ativismo que consideramos repreensíveis
É fácil desprezar progressistas. A popularidade de suas posições tendem a serem lentas e frágeis, apoiados pelos sussurros de incentivo de seus pares e a facilidade com que rebatem as ideias igualmente ineptas de seus oponentes tradicionais na direita. É fácil olhar para o amor que têm pela forma democrática, e perceber na frequência com que autodenominados ativistas também são de esquerda, uma fusão das duas coisas. Nós encontramos essas críticas ao ativismo se proliferando em círculos anarquistas atuais, uma repulsa ao ciclo de reuniões sem fim, assim como uma rejeição ao consenso e a assembleia geral, a forma a legislativa que quer controlar a tudo e todos, acabando com a própria possibilidade de volatilidade. Entretanto, apesar de nossas críticas, como em muitos outros casos, tendemos a nos focar nos erros e defeitos mais evidentes, e no caso do ativismo apontar imediatamente as táticas ultrapassadas de teatralidade de manifestantes incoerentes e a alegre ingenuidade dos caridosos que querem construir um mundo melhor uma barriga cheia de cada vez.Não é preciso muito para descartar suas políticas como sem sentido, suas motivações como exibicionistas, suas práticas como invasivas, ou sues esforços como inevitavelmente inefetivos, mas o tipo de análise que busca apenas descartar a posição ativista falha em compreender suas bases conceituais como a fonte de onde estes outros fenômenos surgem. Não é que ativistas falham por conta de suas longas reuniões ou apreciação por gritar com prédios vazios: estes são meramente sintomas de uma doença mais generalizada. Na verdade, a falha do ativismo surge no cerne da posição ativista de agir a todos os momentos no terreno discursivo de um suposto “diálogo social”, e ao nos declararem vitoriosos uma vez que “algo” aconteça, desde que nós façamos “alguma coisa”.
Tese 2: O ativismo constrói um terreno de engajamento simbólico em um espaço conceitual, definido pelas políticas de denúncia ligadas a uma necessidade de agir contra problemas definidos de uma forma completamente despacializada.
Por ativismo nós não nos referimos ao que progressistas fazem. O ativismo é definido por seu absurdo enclausuramento em uma narrativa kantiana dos chamados, espaços democráticos, onde pesquisas de opinião substituem lutas reais, mas a crítica ao ativismo pode facilmente acabar contida dentro dos limites de nosso desdém por progressistas. Não podemos igualar os incômodos gerados por progressistas com ativismo. Ao contrário, ativismo é uma apreciação em agir politicamente contra algo ruim onde essa ação política é a representação do descontentamento através da teatralidade e das reivindicações, ou tão divergente disso quanto o assassinato de uma figura pública como sinal de seriedade, englobando atividades tanto na esquerda quanto na direita, na ação direta ou em protestos. Nestes termos, um ataque à bomba a uma clínica de aborto é ativismo, assim como os manifestantes por direitos das mulheres pegos no raio da explosão, já que ambos construíram terrenos simbólicos completamente despacializados que representam seu descontentamento, meramente diferindo de seus símbolos favoritos e a audiência para a qual dirigem seus respectivos reclames.
Fundamentalmente, o ativismo se baseia na tentativa de influenciar as operações simbólicas de algum conceito-inimigo unitário que existe em um terreno abstrato e generalizado no qual não existem características, e nos quais desequilíbrios logísticos nunca acontecem. O terreno de engajamento é removido do dos espaços onde as ações acontecem, e o inimigo se torna descentrado da materialidade prática. Portanto, não é uma questão de ativistas tendo fobia de discussões sobre lutas materiais ou narrativas de efetividade, discussões de variação de terreno e movimentos de forças policiais, mas sim que dentro do plano conceitual de engajamento nenhum destes elementos importa. Não é nem o caso de que ativistas são incapazes de discutir estes temas, é que dentro das limitações conceituais do ativismo elas não fazem sentido.
Tese 3: É esta formação que nos leva ao atual impasse, onde tentativas de transcender o ativismo replicam a mesma formação mas através de ações de maior magnitude.
O movimento para além do ativismo não é resolvido ao desistir-se dos termos e clichês progressistas. O histrionismo e teatralidade ativista encontra muito espaço para brincar entre carros incendiados e calçadas cobertas de cacos de vidros, nos relembrando que uma mensagem não precisa de palavras e um objeto também pode ser um símbolo. Reagindo ao conservadorismo vivido pela esquerda, ou seja, aos ativistas, é e se esperar que surja o pensamento de que se pode transcender o ativismo, o que chamamos esquerdismo, ao simplesmente ir além dos limites do tipo de ações que eles estariam dispostos a realizar. Através de exibições maiores e mais belamente destrutivas, o ativista pós-esquerdista constrói uma colagem de misturas para representar sua insatisfação. Dessa forma, as críticas superficiais permitem que o ativismo ganhe novas cores e apareça sobre outras bandeiras, com seus princípios estratégicos e formações táticas inalteradas. É preciso evitar a mitologia tão presente na militância onde instituições são tratadas como corpos onde se podem desferir golpes, onde escaladas lineares de força, mais destruição! Bombas maiores! são interpretadas como um aumento direto na eficiência, como se explodir o lobby de um escritório da IBM atrapalhasse o funcionamento das logísticas do apartheid mais do qualquer ATM destruído no meio da noite pudesse atrapalhar o sistema bancário.
Tese 4: Para superar o impasse, não é uma questão de irmos além das reivindicações em direção a outras formas de ação simbólicas contra inimigos despacializados, mas de definir o inimigo num sentido material e imediato.
Está implícita na operação do ativismo, a existência de um projeto compartilhado do qual o ativista, seus oponentes e várias entidades neutras fazem parte. Os inimigos dos ativistas então, são um conjunto específico de coisas ruins que eles buscam corrigi e seus oponentes são colegas que meramente acabam por estar do lado errado do problema. Em comparação, os inimigos dos insurgentes nunca são abstratos, mas sim entidades específicas, de carne, tijolo, ou aço, de corpos a prédios, que em um tempo e local específico impede seus interesses. Estes inimigos não são parte do projeto insurgente e são definidos por sua exterioridade a ele, tornando a eliminação da oposição o modelo básico de conflito. Engajamento com este tipo de inimigo não é definido pelo esforço em direção a aniquilação no sentido de que o inimigo precise morrer, ou que coisas precisem ser destruídas, mas sim de tal forma que eles deixem de ser o inimigo. Isso não significa que haverá algum momento habermasiano no qual algum tipo comunalidade comunicativa será formada e onde tudo será racional; conflito, ação em si, é tão não racional quanto o movimento material. Isso significa que o engajamento com o inimigo acaba quando ele se torna logisticamente incapaz de obstruir nossos interesses. No ponto de total diminuição da sua força, o conflito evapora, mas isso só pode acontecer num cálculo imediato.
Tese 5: Definir o inimigo em um sentido material e imediato significa ir além do ódio ou da rejeição, em direção a uma postura de hostilidade, ou um antagonismo imediato, neste caso hostilidade com relação ao policiamento.
Ao definir o inimigo nós precisamos nos mover para além de nos alinharmos contra uma abstração e na direção de uma postura de hostilidade para com inimigos que são imediatos e materiais. O inimigo é aquele que é diretamente hostil para com os nossos objetivos independente de declarações de afinidade política. Isso significa que ao definirmos o inimigo nós devemos fundamentalmente mudar nosso entendimento de afinidade, para longe de nos alinharmos por ideologias política ou identidade e em direção a uma concepção que reconheça a potencial presença de inimigos ao nosso redor. Isso é evidente para qualquer um de nós que já teve de lidar com o cansativo trabalho de se articular com progressistas, apenas para descobrir que eles são uma força de desaceleração muito mais efetiva do que a polícia oficial. Estamos cercados de inimigos, e eles não são, como geralmente esperamos, uma força policial mitologizada, o espectro dos ricos, ou algo do tipo. Nós não lutamos com fantasmas e não vemos motivos para nos tornarmos exorcistas políticos: adversários sem corpo não podem nos prejudicar.
Na verdade, “inimigo” só é uma categoria relevante em relação a um conflito material, encontrando seu sentido na emergência do próprio conflito, num plano de engajamento, em termos de onde nós lutamos, e quando nós lutamos. É nesse nível que o inimigo representa uma ameaça direta, é aqui que o inimigo deve ser engajado, e é somente aqui que a hostilidade de fato existe. Quando declaramos aliados e inimigos não estamos simplesmente declarando uma estrutura de afinidade, mas mais especificamente nós estamos distinguindo aqueles que consideramos capazes de nos ajudar em nossos objetivos daqueles que tentarão impedir esta linha de luta. Aliados não precisam ser nem aqueles em que confiamos, mas apenas aqueles com quem podemos trabalhar, ou que podemos usar.
A guerra de classes pode ser uma mitologia efetiva, como Sorel discute, mas somente até o nível que gera conflito. No nosso caso este conflito não é com a polícia como uma unidade abstrata, mas o policiamento como uma operação, como logística de força que funciona no espaço e no tempo. E para nós esta é uma vantagem já que para destruir as logísticas do policiamento não é necessário nem mesmo destruir a polícia, necessariamente, mas apenas interromper sua capacidade de se manifestar, de funcionar nas ruas. A partir do momento que entendemos que o inimigo é a operação material da polícia como ela de fato nos confronta em nossos lares e nossas ruas, nosso engajamento se torno imediato e material. Neste ponto entendemos a operação material da polícia como de fato ela nos confronta em nossas casas e nossas ruas para ser nosso inimigo, então nosso engajamento se torna imediato e material, nos alinhando conta o esforço de definir nossas existências através da força. No imediato tudo se resume a estratégia e táticas, e nesse nível de confronto direto não é uma luta que conseguimos vencer, ao menos por hora. Mas hostilidade não exige confronto direto, e mesmo um único corpo, também é uma operação logística cuja suspensão pode ser alcançada através de subversão esperta e inteligência assim como através da luta direta.
Tese 6: Este movimento rumo a hostilidade exige uma reaproximação da ação com o espaço e tempo da ação, o terreno tático material e imediato formado pelo conflito.
Ao reaproximar a questão da ação para as dinâmicas da ação nós nos voltamos ao material, para longe do simbólico, e nos realinhamos completamente nosso entendimento de onde estamos lutando. No ativismo o terreno do conflito é formado ao redor de relações conceituais; buscar as conexões entre alguma grande empresa específica e o mercado global, manifestações aos sábados em um centro esvaziado onde um bando de progressistas gritam slogans contra prédios federais vazios, participando do jogo de tentarem “mudar a consciência” ao debater abertamente com algum irredimível conservador fascista. Todas estas formas de ação são fundadas no mito de um inimigo simbólico que nós devemos enfrentar em algum terreno discursivo não especificado. O que perdemos é qualquer tipo de interação, que evapora junto do entendimento de onde o inimigo de fato funciona, como ele funciona, e quais de fato são características do terreno da funcionalidade.
Veja o exemplo do Deep Green Resistance, onde o terreno de ação é reduzido a pontos inertes em um mapa, “infraestrutura”, que é pensada como um terreno estático, uma mentalidade que funciona dentro da lógica dos bombardeios estratégicos, a redução de alvos para pontos imóveis no espaço observados à 30.000 pés de altura. Mesmo com essa metáfora eles falham em compreender a funcionalidade de bombardeios estratégicos na era dos mísseis inteligentes que, entendido através da doutrina do Ataque Paralelo, é uma tentativa de interromper o comando e controle do inimigo para preparar o campo para um confronto material em um terreno dinâmico, mais do que um fim em si mesmo. O que se perde nesse debate de espaços inertes, terrenos reduzidos a mapas, é que o inimigo se adapta, o inimigo se move, o inimigo reagrupa. Ataques desencadeiam contra-ataques, e isso continua até que o inimigo esteja incapaz de funcionar, de se mover, de manter uma ontologia logística. Para começar a fazer este movimento para além de inimigos conceituais inertes não só exige um entendimento do inimigo de um modo imediato e material, mas também exige um reconhecimento de que toda estratégia se torna obsoleta no momento do conflito; como dito por Moltke, “nenhum plano de operações se estende além do primeiro contato com uma força inimiga”.
Durante hostilidades o terreno é reconfigurado pelas próprias ações que são tomadas e ajustes precisam ser feitos. Neste nível não é somente importante compreender o terreno físico, as características do terreno e suas variações, mas também entender as dinâmicas naquele terreno, as coisas que acontecem, as outras forças presentes, sejam antagonistas ou não. Como atores individuais nós nunca vamos compreender completamente este terreno. No máximo podemos, através de intenso levantamento de inteligência vir a entender algumas das dinâmicas em um terreno, e vir a desenvolver uma forma mais ou menos efetiva de interpretar o que aconteceu. Nesses momentos, nunca devemos permitir que nossas abstrações vaguem pra longe do material e, de tão soltas, vaguem para longe de nós. E caso isso aconteça, de maneira alguma devemos nos deixar seremos levados.
Tese 7: A reaproximação da ação ao material e imediato separa a questão da estratégia/luta da questão de porque lutamos, do terreno compreendido conceitualmente.
No movimento de se distanciar dos terrenos de engajamento simbólico para um entendimento material de ação e conflito baseado na imediaticidade da luta, outra mudança fundamental deve acontecer onde a questão meta-conceitual do porquê lutamos está separada da questão sobre o que é lutar. Ativistas completam seu movimento absurdo rumo o simbólico com a declaração simplista de que nos tornamos nosso inimigo se estamos dispostos a empregar os mesmos meios. Sob esta afirmação está um tipo estranho de essencialismo tecnológico, um que espelha as posições de futuristas e primitivistas, que nos põe a imaginar um mundo onde tecnologias tem um conteúdo essencial independente de seu uso. O que se ignora aqui é o uso dos meios no nível de seu posicionamento dentro de técnicas mais abrangentes, uma que deve levar em conta o método e propósito da aplicação, e a existência factual da tecnologia, ou técnica, conforme ela se desenvolve em algum momento histórico específico em resposta a dinâmicas da história. Nós precisamos abandonar o reducionismo gandhiano que sustenta esta visão de alguma conexão necessária entre meios e fins, e passar a compreender algo bastante simples sobre conflito: os meios do conflito têm significado somente durante seu emprego.
Para sermos honestos com nós mesmos, as formas como racionalizamos o mundo sempre são interpretativas, arbitrárias, limitadas e dinâmicas, sob a luz do que podemos entender no presente, que dirá em algum futuro pós-revolução, é um absurdo. E esse absurdo traz consigo um perigo que ultrapassa em muito as limitações de armas ou preocupações ideológicas com meios. No esforço de falar da totalidade do presente ou para planejar algum futuro que supostamente deve acontecer após uma série de eventos tão catastróficos que as categorias que usamos para darmos sentido a vida hoje não são mais relevantes, seja a revolução ou o colapso, nós perdemos de vista qualquer presente, um terreno imediato de engajamento do qual nós podemos ao menos tentar fazer algum sentido.
Não há uma tática suprema a ser desenvolvida, nenhuma possibilidade de que o passado vá recriar a si mesmo no presente ou no futuro, não há entendimento do que precisamos fazer para avançar a luta, não há um momento eterno ou terreno genérico no qual algo assim seria uma resposta possível. Só o que existe são as capacidades do presente, dinâmicas do presente e algum objetivo que consideramos como importantes. Sendo assim, nós não podemos de fato entender a totalidade do mundo, ou mesmo de um momento específico, “botar nossas ideais em ação” é impossível; tanto pela impossibilidade desse tipo de unidade ou consenso numa forma real, mas também dado nossa inabilidade de sempre inscrever algum significado necessário a nossas ações; coisas acontecem, por inúmeros motivos, e nos sobra a tarefa de em vão fazer sentido delas, do outro lado da infinita distância que divide o conceito do momento.
Cada um de nós têm seus motivos para agir como agimos, e não é como se pudéssemos evitar. Nós não podemos evitar a história, tudo que fazemos dá as condições para momentos futuros. Nós não podemos evitar a guerra social; o estado é uma logística de força que opera no nível em que essa aplicação de força é total. A guerra se tornou pervasiva em dinâmicas mutáveis de incontáveis contingências imediatas; é no nível das contingências imediatas que o engajamento deve acontecer; é neste nível que decisões devem ser feitas sobre como engajamos com a guerra total. Que lado escolhemos, se estamos com o estado ou com a insurgência, é algo que cada um de nós deve responder por si mesmo, com nossos próprios motivos, arbitrários, conceituais e provisórios. A questão que isso implica, como uma forma de decisão imediata, pode ser respondida somente no momento da estratégia necessariamente entrelaçada com as dinâmicas deste conflito. Nós precisamos desvincular a ação da paixão e chegar a um equilíbrio com os riscos e consequências. A insurgência não é nem romântica, nem apaixonada, é material, estratégica, e geralmente trágica. A maior tragédia é que nós fomos postos em uma posição onde essa decisão precisa ser considerada, mas uma vez que uma decisão seja tomada, a questão conceitual se torna secundária, superada pela questão da sobrevivência, e do movimento estratégico.
Tese 8: Esse é um movimento de realinhamento, do ativismo a insurgência.
Em seu cerne, o atual e aparentemente perpétuo impasse, resumido na questão do que deve ser feito, replica o ativismo em uma série de níveis. A questão em si, quando dita, implíca em um “nós” que vai responder essa questão, e um corpo de engajamento discursivo que existe em algum plano consistente, replicando a mitologia do consenso. Mais importante, a ideia de que sequer existe uma resposta para essa questão, uma que possa ser aplicada em larga escala, supõe um terreno de consistente engajamento ao longo do tempo e do espaço. É aqui que todos engajamentos simbólicos são fundamentalmente estruturados, supondo que estamos lutando desta mesma forma, ou que existe uma comunalidade essencial para as dinâmicas em que lutamos.
Superarmos essa série de pressupostos, que nos levam a replicar as falhas do ativismo, significa reconsiderar não apenas os fundamentos do que fazemos, mas também o contexto no qual os fazemos. Essa não é uma questão se nós devemos engajar com o ativismo em algum sentido geral, se o “movimento” é algo que nós devemos participar, ou uma questão de nos focarmos na ilegalidade. Todos esses debates, ainda supõem o terreno generalista do engajamento onde é tacitamente entendido que a eficácia teórica pode ser igualada com efetividade material. Mas não existe tática certa, nem forma universal de engajamento, e certamento não há uma resposta a questão “do que fazer”.Nós devemos abandonar totalmente o próprio terreno simbólico de ação, mas isso não significa que devemos deixar de engajar com o ativismo. Ativismo pode ser uma tática efetiva em escala, como Maraghella discute, isso significa que nós precisamos abandonar o modo ativista de engajamento, e passar a nos guiarmos por dinâmicas factuais e numa hostilidade contra o inimigo material e imediato. Isso significa adotar a insurgência, um engajamento material imediato, em um terreno material, focado em estratégia e não em teoria política abstrata; uma reorientação da questão da ação e de aguardar, engajando quando e como engajamento é estratégico, e apenas parar gerar o efeito máximo.
Nós não podemos mentir pra nós mesmos, o que enfrentamos não é nada menos que guerra; uma sem campos de batalhas definidos, sem fronteiras e sem fim. Uma guerra tão pervasiva que condiciona nossas possibilidades de existência, que se tornou o padrão de realidade. Esta é uma guerra que estrutura nosso terreno, inspira nossas cidades, e organiza nossa linha de movimentos através do espaço. É uma guerra… e é neste plano que devemos entender nosso engajamento. Tentativas apaixonadas de engajamentos incisivos geralmente são mau planejados, e raramente conectam quaisquer pontos estratégicos de intervenção. Nós vemos isso frequentemente com lobos solitários ou guerrilhas urbanas com seus ataques simbólicos contra um inimigo simbólico, apesar de suas consequências bastante materiais. Esse engajamento com as dinâmicas da história, em toda sua imediacidade, em toda sua materialidade, é a mudança do ativismo para a insurgência.
Tese 9: Insurgência não é algo que pode sr definido em si mesmo, exceto como um engajamento imediato e material e engajamento material da hostilidade em direção um inimigo imediato dentro de um contexto de guerra.
Ser um insurgente significa reavaliar nosso relacionamento com os chamados movimentos sociais, e também nosso papel fora deles. Por exemplo, progressitas não são aliados, apesar de frequentemente haver confusão sobre essa questão. Essencialmente, seus objetivos sempre envolvem alguma tentativa paternalista de definir a vida cotidiana, e usam o estado para fazê-lo; assim, não deveria ser surpresa que eles frequentemente colaboram com a polícia. Isso não significa que eles não possam ser usados, ou que a participação movimentos sociais seja necessariamente inefetiva, mas para sermos capazes de reavaliar o relacionamento que qualquer um de nós tem com movimentos sociais nós precisamos reaprender o que são os ditos movimentos sociais, e isso exige parar de entendê-los com uma necessidade e passar a vê-los como uma tática, uma forma de engajamento que tem limitações dramáticas, que sob as condições adequadas pode vir a ser útil. Mas ir além desse ponto significa nos movermos para além de definir oque fazemos como essa coisa que existe de alguma forma consistente ao longo do espaço e do tempo.
Nós já discutimos a necessidade de nos movermos para além da questão do que precisa ser feito, para reconhecer a particularidade dos meios e dinâmicas do engajamento de terrenos específicos onde evoluem paralelamente; a necessidade de se superar o ativismo e adotar a insurgência, um engajamento imediato com o inimigo em um contexto de guerra. Mas conforme fazemos este movimento nós precisamos ser cuidadosos para não cairmos na armadilha de definir a insurgência como um objeto abstrato, como uma série de táticas, como necessariamente uma coisa ou outra fora da imediaticidade do engajamento. A insurgência não é violenta nem pacífica, nem simétrica ou assimétrica, armada ou desarmada. Insurgência não é algo a ser pensado, mas uma forma de engajamento que se dá na hostilidade para com o inimigo, e revela a si na postura em direção a guerra em que nos encontramos, onde quer que estejamos, em nossas vidas cotidianas.
Quando falamos sobre a necessidade de superarmos o ativismo e irmos na direção da insurgência nós não estamos falando de um aprofundamento da militância; militância pode ser tão perigoso quanto pacifismo e é uma forma de ativismo a sua própria forma. Estamos falando da necessidade de evitar tanto a tragédia do Red Army Faction quanto do Occupy, a necessidade de abandonar terrenos simbólicos de engajamento, onde lutamos contra inimigos não especificados em um terreno político abstrato através da elaboração das nossas paixões. Nós estamos falando da necessidade de aterrarmos nosso entendimento do que estamos fazendo, separado do porque estamos fazendo, no espaço onde as coisas de fato acontecem, no aqui e agora, e para fazer o esforço de basear esse engajamento em preocupações de estratégia, de hostilidade contra o inimigo em algum sentido imediato, e não em algum esforço de construir um argumento, de “denunciar os poderosos” ou qualquer outra coisa que se passe por ação. Nós estamos falando de uma postura contra o inimigo onde atacamos quando temos a vantagem, e esperamos quando não temos, e usamos os meios que vão completar nossos objetivos, e não aqueles que vão nos manter de consciência leve.